Saindo às 5h: 00min da manha de uma terça-feira
de agosto de 2013 para ir ao tão famoso (yume) Monte Fuji, ou Fuji-san, como
conhecido no Japão. O sol já se fazia presente e prometia aquecer o
acompanhamento das horas do dia. Às passagens de um trem a outro trem, mudavam-se o
ritmo do movimento. Não do trem, das pessoas. Ora mais lentas, ora mais
rápidas. Em lugares aumentavam as presenças, em outros diminuíam. O trem, nos
interiores, oferece a calma de um embalo de berço. Os sons emitidos transportam
para um mundo de filmes; como se você estivesse assistindo a uma cena em 3D. Na
verdade, eu estava vivendo uma cena real em muito mais dimensões! O trem, os
sons, o embalo, a paisagem montanhosa. Perfeito! Chegada ao predestino às 13h: 30min,
saída para o destino de fato, às 14h: 55min. O caminho se fez comum até o ônibus
alcançar aos arredores do Fuji-san. Ali você houve o silencio. A Floresta Aokigara
[青き柄]. Também conhecida como Floresta dos Suicídios reserva,
não apenas em seu interior, mas em seu todo, o que se diz por silencio. Lá,
você o escuta. O silencio se faz imponentemente; indiscutível. Senhor do seu
espaço e tempo. Nem mesmo os elementos naturais, como o vento, ousam
desafiá-lo. A sensação é para ser sentida, e apenas, sentida. É uma sensação
densa e magnânima, que pode ferir a fragilidade de alguém que a desafie permanecer
com ela. Como todos os sentimentos, sensações e momentos, a floresta Aokigara. deve
ter seu tempo respeitado a cada pessoa, a cada situação de se estar lá. Ou, não se estar. Subindo a montanha, o tempo
vai ficando cada vez mais nublado, chuvoso. Chegando a Base escolhida [gogome] para
começar a caminhada, às 16h: 30min, o tempo está fechado. Mal se vê a própria montanha!
A equipe de turismo não deixa subir, pois a temperatura está prevista para
menos 10˚C próximo da 1h da manha. Tenho que aguardar até às 20h... então,
vamos esperar. Uma conversa aqui, outra ali. As pessoas chegando aos números. Vários
alongamentos e momentos de meditação. Sim, meditação! Uma musica. Uma prática
de taiji...e assim passaram as horas, à subida foi liberada a partir das 19h
para quem iria até o cume. São sete estações a partir dali. Eu estava na
quinta. São 7,5 km, ou 3776m para cima, nesse momento! A noite está iluminada apenas
por lanternas e o tempo continua nos acompanhando com chuviscos. O olhar fica
concentrado apenas no foco da lanterna. A cada hora se precisa estar atento a
localizar o terreno e onde colocar cada pé, no meu caso, mais dois bastões para
auxiliar. Escorregões fazem parte desse cotidiano, mas além das pedras, pouco
se vê ao inicio da subida noturna. Não é indicado ficar olhando para os lados! Algumas pessoas sobem conversando, rindo... até
chegar a primeira(sétima, no total) estação, depois dali as conversas diminuem para
aqueles que decidem continuar. Ao chegarmos à oitava estação o céu abre, o
vento para e as estrelas e lua aparecem. Aí sim vale uns minutos mais de parada
para apreciar. Alias, são varias paradas pequenas de 03 a 05 minutos pelo caminho
para respirar melhor. As pessoas passam
por você e você passa depois por elas. E daí, mais a frente elas te passam... e,
no final, parecíamos velhos conhecidos, num cumprimento mais cordial e
cotidiano de um dia qualquer. Ou melhor, de uma noite qualquer. A trilha
noturna do Fuji-san lembra uma procissão com velas. As pessoas andam atrás umas
das outras, em passos ora cadenciando para um ritmo mais lento, ora mais frenético...
mas não há espaço para agitações. A cada estação uma parada para quem quisesse...
fechada. Somente banheiro aberto... pago. Cheguei ao topo às 3h: 15min, com
respiração um tanto ofegante, mas sem cansaço ou qualquer dor. A temperatura estava
na média dos 03˚C negativos. As estrelas adornavam o céu e o vento resolveu voltar...
gélido! Mas, afinal, eu havia chego, então, arrumei um lugar protegido do vento
e literalmente, sob as estrelas e sobre pedras fechei os olhos por uns 45
minutos. Exatos 30 minutos após o sol começa a nascer em pleno pico do
Fuji-san! Eram 4h: 30min e a temperatura se encontrava a 4˚C negativos. Como
tinha gente para ver! O sol nascia e as pessoas o reverenciavam. Alguns de
maneira singela, com olhar de embevecimento e um sorriso suave na face. Outros usam
de expressões altivas, som alto da voz. Risos, lágrimas, idolatria. Senti-me um
tanto quanto ‘um peixe fora d’água’. Sim, gostei de ter visto; foi bonito e
grato este momento. Mas, foi mais um nascer do sol bonito. Isso. Depois de
quase 1h: 30min observando este momento, começamos a nos dispersar e ver o que
havia ao redor do local. Templo, cratera, placas, pedras, pedras, pedras... a
descida comecei as 7horas da manhã, com o sol já alto. Aos poucos também outras
pessoas foram descendo. Outro cenário se revela e requer da pessoa toda e
qualquer atenção. Na verdade, isto é imperativo em tempo integral. Atenção! E olhar!
Mas aqueles que apenas olham guardam a si sua segurança. Pois o cenário merece
contemplação! Todo redor, em declive acentuado, é composto por larva vulcânica ressequida,
transformada em arenito, areia, pedras, pedregulhos...de cores
diferenciadas...e, de repente, uma suave camada de neve contrastando com o
escuro. E de repente, de novo, uma flor, várias flores compondo um canteiro
gigantesco de... arbustos floridos. As paisagens se revelam mais e diversas a
luz do dia... assim como as pessoas, suas roupas, apetrechos de montanhismo,
linguagem materna. Em meio da manhã, lá pelas 9h, a temperatura já apontava próxima
a 28˚C, no mesmo lugar das baixas temperaturas da noite anterior. Agora as
paradas estavam abertas. A cada parada um lanche, hidratação e descanso prévio
de 10 a 15 minutos. Quase o mesmo da subida. A diferença ficou para mim, na descida.
Senti muito mais que a subida. Embora fosse o mesmo local, o mesmo solo, a
descida me pareceu mais arriscada e desafiadora que a subida, pois os escorregões
foram alguns. O que me faz pensar que, às vezes, não ver, ou ter uma visão
restrita pode ser um grande aliado, se o usarmos incorporado com outros
sentidos que temos: tato, olfato, por exemplo! Cheguei à estação 5 ͣ exatas 14h, troquei de roupa e peguei o ônibus para voltar. Depois, a mesma quase
rotina na volta... os trens, os sons, as paisagens, as pessoas...com uma
diferença, alias três, o cansaço, a atenção e curiosidade das pessoas que se
aproximavam para conversar sobre o bastão que eu trazia a mão (esqueci de
mencionar, o bastão caminhante adquire e as estações carimbam sua ida ao monte
Fuji). Dos mais jovens vinha à curiosidade; dos mais velhos era possível observar
a emoção vinculada ao Monte Fuji-san e uma certa admiração e respeito por ver
que a estrangeira estivera lá, especialmente que fora até o cume. Aqui no Japão,
como em várias outras culturas, existe um ditado que todo japonês deve caminhar,
ao menos, uma vez na vida ao topo do Monte Fuji.
O interessante é que o monte é uma montanha bela
e de encantos como qualquer outra. Mas a imagem que se construiu sobre a
montanha a partir da cultura e historia japonesa, tornaram-na poderosa,
respeitada e famosa. Penso que as pessoas que têm o desejo de fazê-lo, assim
como as que já passaram e passam ficam encantadas com o que veem não apenas
pela beleza da paisagem, mas porque se superaram nos obstáculos, dificuldades e
restrições [eu me coloco, agora entre essas]. Porque depois de um sofrimento,
seja qual for sua natureza ou origem, o seu alivio é sempre bem-vindo! Isso tem
vinculação direta com as raízes histórico-culturais e a filosofia de vida do
Japão. Mas perceber isso é apenas um dado reflexivo; caso a subida e a descida
do Fuji-san sejam tomadas apenas como uma aventura turística! E, também, um desperdício,
em minha humilde compreensão. Além disso, os arredores do Fuji-san oferecem
também experiências muito diferenciadas e tão belas e intensas quanto. Alias, é
como outro pensamento que existe por aí que diz que o caminho pode ser muito
mais gratificante do que atingir o objetivo.
Mas não
é imperioso escalar uma montanha, ou caminhar por longos caminhos, é possível que,
guardadas as proporções, tenhamos elementos parecidos em nossa vida, e, se for
o caso, que aprendamos a aproveitá-los. Que esse autoconhecimento não envolva necessariamente
o abandono de nada em particular. Mas sim, a percepção genuína particular da
responsabilização pelo próprio caminho. Os próprios olhos. O próprio coração. E
as próprias pernas (pra chegar até lá, ou aqui). O pensamento que me
está em alguns sites que participo me identificando, também é bem apropriado a
esse momento: “Para nossas perguntas devemos nos tornar as próprias
respostas... com o corpo, com a mente, com o espírito e com a ação” (K.Kushner).
Eu mesma acredito que a sabedoria só aconteça
quando a pessoa transforma e transporta o que viveu em sua prática de vida!
outras informações sobre o Monte Fuji-san:
Muito bem escrito como sempre e um artigo interessante que deveria ser compartilhado não só entre os amigos/família mas também outras pessoas que tiveram a mesma experiência ou uma parecida, ou ainda por pessoas que têm interesse em aprender sobre o que existe de belo neste mundo em que vivemos e a cultura que envolve cada beleza. Parabéns! Acho que voce deveria publicar em um jornal ou no Google!
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